domingo, 20 de dezembro de 2015

Uma análise das mazelas humanas, observadas dos exercícios das minhas profissões.















Luiz Carlos Nogueira











Hoje eu estava desmanchando papéis, velhos documentos que consistiram de análises contábeis, orientações e pareceres jurídicos, etc. que precisavam ser destruídos por consequência da minha aposentadoria, depois de transcorrido o tempo da minha responsabilidade legal em face dos seus conteúdos.

A destruição desses documentos teria que ser feita por incineração, ou por meio de um triturador. A incineração traz o inconveniente da fumaça que produz e o uso do triturador exige a retirada de grampos, clipes, o que torna a operação um pouco mais difícil, até pela quantidade pequena que o triturador pode suportar. Por conta disso imaginei que se usasse um tambor com água (com tampa, para evitar a ação dos mosquitos), no qual coloquei os documentos retirados das pastas de arquivos, sem ter que separá-los para guardar ainda alguns outros pela ordem de importância, já que o prazo transcorrido me deu essa condição, ou seja, para destruí-los todos, por lotes e de uma só vez.

Durante o processo de destruição desses papéis, meus pensamentos me remeteram ao passado, e me dei conta das várias situações nas quais estive frente às questões das torpezas humanas, ou seja, no tempo em que fui bancário, contador, auditor contábil e advogado, quase não me lembrei das raríssimas vezes em que fui procurado por um cliente ou mesmo por um dono de empresa, para obter minhas orientações de como fazer determinada coisa, corretamente e dentro do que prescrevia as legislações pertinentes. A maioria das vezes, pretendiam que eu procedesse de forma não recomendável, ou tentavam obter algum parecer, alguma orientação que no íntimo sabiam que eram erradas, mas que se eventualmente eu sinalizasse alguma possibilidade de fazê-las ou executá-las, com risco de serem descobertas futuramente, o que sempre um dia isso acontece, invocariam a isenção da sua culpa sob o argumento que só fizeram ou procederam dessa ou daquela forma, porque desconhecendo a legalidade ou o procedimento correto, obtiveram a minha orientação e meu aval profissional.

Numa ocasião em que eu era contador geral de uma empresa, que foi vendida e o seu novo presidente chamou-me para fazer uma alteração nos seus registros contábeis, que no futuro trariam consequências graves, porque não havia como não aparecer perante o fisco e a bolsa de valores — tive que me demitir no mesmo momento.

Outras vezes, eu acabava discutindo e rejeitando severamente algumas práticas que seriam forçosamente descobertas pelas auditorias,  nos cruzamentos de informações e de dados, embora isso fosse menos mau do que se fossem detectadas pelo fisco. Quando isso acontecia, era motivo de minha preocupação, dormia mal com receio de ser demitido, pois tinha família para sustentar e com filhos cursando faculdades.


Com este artigo, não quero assumir ares de suprema honestidade, mas apenas dizer que os profissionais de quaisquer áreas, podem (e devem) fazer uma opção de como procederem na vida — qual seja, de não trabalharem deliberadamente de forma errada ou fora das normas profissionais ou legais. Essa escolha não facilitará suas vidas, pelo contrário, poderá até dificultá-las para ganhar dinheiro fácil, porém, jamais sofrerão condenações em processos como estamos assistindo acontecer no Brasil, dos: mensalões, petrolões, eletrolões, beenedeezões e todos os demais “ões” do mesmo gênero criminoso.


E é oportuno citar as palavras de Hannah Arendt[i], que nos dá, na realidade, a entender que as investidas humanas na tentativa de obter proveito próprio, traz ínsitamente a busca pelo poder que corrompe : “O poder corrompe, de fato, quando os fracos se unem para destruir o forte, mas não antes. A vontade de poder, denunciada ou glorificada pelos pensadores modernos de Hobbes a Nietzsche, longe de ser uma característica do forte, é, como a cobiça e a inveja, um dos vícios do fraco, talvez o seu mais perigoso vício.”

Assim, a busca de sempre obter vantagens, por pequenas que sejam, conduz o ser humano à procura de poder, especialmente na política. E se eventualmente um indivíduo que cultiva essa natureza, consegue galgar o governo de um país, e depois começa a promover atos que destroem sua credibilidade e causam insegurança ou medo na população, acaba se isolando e tronando-se um tiranete, que só consegue promover a destruição desse país, porquanto faz de tudo para aumentar seu poder e se manter nele a qualquer custo, não importando como e nem com o quê.

Aliás, esse tipo de político que exerce a tirania, penso eu, que na verdade trata-se de psicopata, como bem descreve Andrew Lobaczewski[ii] em seu livro “Ponerologia: Psicopatas no Poder, do qual extraí do texto a seguir, contido no  prefácio do prof. Olavo de Carvalho:

“[...] alguns estudantes de medicina na Polônia, na Hungria e na Checoslováquia começaram a notar que havia algo de muito estranho no ar. Eles haviam lutado na resistência antinazista junto com seus colegas, e isto havia consolidado laços de amizade e solidariedade que, esperavam, durariam para sempre. Aos poucos, após a instauração do regime comunista, novos professores e funcionários, enviados pelos governantes, estavam alterando profundamente o ambiente moral nas universidades daqueles países. Um jovem psiquiatra escreveu:

(…) sentíamos que algo estranho tinha invadido nossas mentes e algo valioso estava se esvaindo de forma irreparável. O mundo da realidade psicológica e dos valores morais parecia suspenso em um nevoeiro gelado. Nosso sentimento humano e nossa solidariedade estudantil perderam seus significados, como também aconteceu com o patriotismo e nossos velhos critérios estabelecidos. Então, nos perguntamos uns aos outros, “isso está acontecendo com você também?”.


Impossibilitados de reagir, eles começaram a trocar ideias, perguntando como poderiam se defender da devastação psicológica geral. Aos poucos essas conversações evoluíram para o plano de um estudo psiquiátrico da elite dirigente comunista e da sua influência psíquica sobre a população.

O estudo prosseguiu em segredo, durante décadas, sem poder jamais ser publicado. Aos poucos os membros da equipe foram envelhecendo e morrendo (nem sempre de causas naturais), até que o último deles, o psiquiatra polonês Andrej (Andrew) Lobaczewski (1921-2007), reuniu as notas de seus colegas e compôs o livro que veio a sair pela primeira vez no Canadá, em 2006, e que agora a Vide Editorial, de Campinas, está a publicar em tradução  brasileira de Adelice Godoy: “Ponerologia: Psicopatas no Poder”, do qual extraí o parágrafo acima.

“Poneros”, em grego, significa “o mal”. O mal, porque o traço dominante no caráter dos novos dirigentes, que davam o modelo de conduta para o resto da sociedade, era inequivocamente a psicopatia. O psicopata não é um psicótico, um doente mental. Só lhe falta uma coisa: os sentimentos morais, especialmente a compaixão e a culpa. Não que ele desconheça esses sentimentos. Conhece-os perfeitamente, mas os vivencia de maneira puramente intelectual, como informações a ser usadas, sem participação pessoal e íntima. Quanto maior a sua frieza moral, maior a sua habilidade de manipular as emoções dos outros, usando-as para os seus próprios fins, que, nessas condições, só podem ser malignos e criminosos. Justamente porque não sentem compaixão nem culpa, os psicopatas sabem despertá-las nos outros como quem toca um piano e produz o acorde que lhe convém.

Não é preciso nenhum estudo especial para saber que, invariavelmente, o discurso comunista, pró-comunista ou esquerdista é cem por cento baseado na exploração da compaixão e da culpa. Isso é da experiência comum.

Mas o que o dr. Lobaczewski e seus colaboradores descobriram foi muito além desse ponto. Eles descobriram, em primeiro lugar, que só uma classe de psicopatas tem a agressividade mental suficiente para se impor a toda uma sociedade por esses meios. Segundo: descobriram que, quando os psicopatas dominam, a insensitividade moral se espalha por toda a sociedade, roendo o tecido das relações humanas e fazendo da vida um inferno. Terceiro: descobriram que isso acontece não porque a psicopatia seja contagiosa, mas porque aquelas mentes menos ativas que, meio às tontas, vão se adaptando às novas regras e valores, se tornam presas de uma sintomatologia claramente histérica, ou histeriforme. O histérico não diz o que sente, mas passa a sentir aquilo que disse – e, na medida em que aquilo que disse é a cópia de fórmulas prontas espalhadas na atmosfera como gases onipresentes, qualquer empenho de chamá-lo de volta às suas percepções reais abala de tal modo a sua segurança psicológica emprestada, que acaba sendo recebido como uma ameaça, uma agressão, um insulto.

É assim que um grupo relativamente pequeno de líderes  psicopáticos  destrói a alma de uma nação.”























[i] Arendt, Hannah, A Condição Humana; traduzido de : The Human Condition, por  Roberto Raposo, 10ª Ed.- Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2005. Pág. 215.

[ii] Lobaczewski, Andrew,  Ponerologia: Psicopatas no Poder ; tradução de Adelice Godoy – Campinas, SP: Vide Editorial, 2014. Págs. 6-7.

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